
Se você acha que testamento é coisa de milionário, precisa ler este post até o final.
A verdade é que qualquer pessoa que tenha bens e família pode (e deve) pensar nisso mais cedo do que imagina. Muita gente só se dá conta da importância do testamento quando já é tarde demais, e aí o que sobra para os herdeiros não são apenas bens, mas também um belo pacote de burocracias e possíveis brigas.
Por que você deveria se preocupar com isso agora?
Imagine o seguinte cenário: João, um professor de história aposentado, tinha uma casa, um carro e uma coleção de discos de vinil dos Beatles, que ele valorizava mais do que o próprio carro. Ele sempre assumiu que, quando partisse, seus bens seriam divididos “naturalmente” entre seus filhos.
O problema?
Sem um testamento, a divisão dos bens não foi tão simples assim. Os filhos passaram anos brigando na justiça e, no fim das contas, a coleção de discos (o bem mais precioso para João) acabou sendo vendida para pagar os custos do processo.
Esse tipo de situação acontece mais do que você imagina. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cerca de 50% dos processos de inventário no Brasil levam mais de um ano para serem finalizados, e em muitos casos, a demora ultrapassa cinco anos!
Isso significa que, sem um planejamento adequado, seus herdeiros podem passar muito tempo tentando resolver uma burocracia que poderia ser evitada com um simples documento.
O que é um testamento e como ele funciona?
É um documento legal onde você determina como seu patrimônio será distribuído após sua morte. Ele permite que você tenha mais controle sobre seus bens, evitando disputas familiares e garantindo que sua vontade seja respeitada dentro dos limites da lei.
No Brasil, a legislação estabelece que metade do patrimônio deve, obrigatoriamente, ser destinada aos herdeiros necessários. E quem são esses herdeiros necessários? Eles são os:
- filhos;
- netos;
- pais;
- avós;
- cônjuge.
Essa parcela obrigatória é chamada de parte legítima, que corresponde a 50% dos bens. Isso significa que, mesmo que você faça um testamento, metade do seu patrimônio precisará ser destinada a esses herdeiros, e somente os outros 50% podem ser distribuídos livremente para qualquer pessoa ou instituição de sua escolha.
Parece algo distante? Pois saiba que você pode fazer um testamento a qualquer momento da vida, independentemente da sua idade ou quantidade de bens. Afinal, ninguém tem uma bola de cristal para prever o futuro, não é?
Tipos de testamento no Brasil
Existem três principais tipos no Brasil:
- Testamento público – Feito em cartório, com a presença de um tabelião e testemunhas. É o mais seguro e difícil de ser contestado.
- Testamento particular – Escrito pelo próprio testador, com a assinatura de três testemunhas. Parece prático, mas pode gerar problemas de validade.
- Testamento cerrado – Escrito pelo testador e entregue lacrado ao cartório. O conteúdo só pode ser revelado após sua morte.
Se você quer garantir que sua vontade seja respeitada sem surpresas desagradáveis para seus herdeiros, o testamento público é a melhor escolha.
Se quiser saber mais sobre as diferenças de testamento, você pode ler este post: testamento público e particular.
Quem precisa de um testamento?
Se você tem bens, mesmo que sejam poucos, um testamento pode ser uma ferramenta essencial para evitar conflitos. Isso vale especialmente para quem:
- Tem filhos de diferentes casamentos – Sem esse documento, a divisão dos bens segue as regras do Código Civil, o que pode gerar disputas entre filhos de uniões diferentes, especialmente se houver divergências entre os herdeiros.
- Vive em união estável – Se não houver um planejamento sucessório, o companheiro pode não herdar automaticamente tudo, dependendo do regime de bens e da existência de outros herdeiros.
- Não tem herdeiros diretos – Na ausência de descendentes ou cônjuge, a sucessão pode acabar beneficiando parentes distantes ou até mesmo o Estado, caso não haja herdeiros habilitados.
- Possui bens de valor sentimental – Quem vai ficar com sua coleção de HQs raras ou aquele violão autografado pelo Paul McCartney? Sem um testamento, a divisão pode não respeitar seus desejos.
- Deseja deixar parte do patrimônio para caridade – Se você pretende beneficiar uma instituição ou uma pessoa que não seja herdeiro necessário, precisa formalizar essa vontade.
- Quer evitar disputas entre familiares – O dinheiro pode ser um grande motivo de conflito, e planejar reduz as chances de brigas e processos demorados.
O que acontece quando você não faz um testamento?

Se você não deixar um testamento, seu patrimônio será distribuído conforme as regras do Código Civil. Vamos verificar o que pode acontecer com seu patrimônio neste caso.
Seu cônjuge ou companheiro pode não herdar tudo automaticamente
Dependendo do regime de casamento, ele ou ela pode ter que dividir os bens com seus filhos ou até mesmo com seus pais, se ainda forem vivos. Em casos de união estável não formalizada, o parceiro pode até ser excluído da sucessão.
Seus bens podem ficar bloqueados
O processo de inventário pode levar anos, e nesse período, os herdeiros podem ficar impossibilitados de vender ou usar certos bens. Isso pode ser especialmente problemático se houver dependentes financeiros ou necessidade de custear despesas urgentes, como tratamento médico.
Brigas familiares podem acontecer
O dinheiro pode ser um grande motivo de discórdia, e sem um documento claro, os conflitos são quase inevitáveis. Discussões sobre quem tem direito a quê podem acabar levando a longas batalhas judiciais.
Dívidas podem impactar a herança
Os herdeiros não herdam as dívidas do falecido, mas elas devem ser quitadas antes da partilha dos bens. Se o patrimônio não for suficiente para cobrir os débitos, alguns bens podem precisar ser vendidos para pagar credores.
Pode proteger parte do patrimônio
Se houver cláusulas restritivas, como inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, é possível evitar que herdeiros percam os bens por dívidas ou disputas judiciais futuras.
O Estado pode herdar seus bens
Se você não tiver herdeiros diretos (filhos, cônjuge, pais, irmãos) e não deixar um testamento indicando para quem deseja destinar seu patrimônio, seus bens podem ser recolhidos pelo Estado.
Companheiros, enteados e amigos podem ficar sem nada
Apenas os herdeiros legais têm direito à sucessão. Se você deseja beneficiar alguém que não está na linha de sucessão legal, como um amigo, um enteado ou uma instituição de caridade, o testamento é essencial.
Fazer um testamento é uma forma de garantir que sua vontade seja respeitada e evitar problemas para quem fica. Mesmo que seu patrimônio seja pequeno, a organização prévia pode evitar desgastes emocionais e financeiros para seus entes queridos.
O testamento pode ser contestado?
Sim, esse documento pode ser contestado, principalmente se houver suspeitas de que ele foi feito sob coação, fraude ou se a pessoa que o assinou não estava em plena capacidade mental.
Além disso, um testamento que desrespeite a parte legítima dos herdeiros necessários (filhos, cônjuges e pais) pode ser anulado pela justiça. Para evitar problemas, é essencial que o documento seja feito com acompanhamento jurídico e registrado em cartório.
Outra forma de garantir que os bens sejam utilizados conforme a vontade do testador é a inclusão de cláusulas restritivas, como:
- Inalienabilidade: impede que o bem seja vendido ou transferido pelo herdeiro.
- Impenhorabilidade: protege o patrimônio contra dívidas do herdeiro, impedindo que seja penhorado por credores.
- Incomunicabilidade: garante que o bem não seja dividido com o cônjuge do herdeiro em caso de casamento ou divórcio.
Essas cláusulas são especialmente úteis para evitar que o patrimônio seja dilapidado por má administração, dívidas ou disputas conjugais. No entanto, é fundamental contar com assessoria jurídica para garantir que sejam aplicadas corretamente dentro dos limites legais.
Como fazer um testamento passo a passo

Fazer um testamento é um processo que exige planejamento e atenção aos detalhes para garantir que seus bens sejam distribuídos conforme sua vontade e sem complicações para seus herdeiros.
O primeiro passo é entender qual tipo de testamento melhor se adapta à sua situação. No Brasil, os mais comuns são o testamento público, feito em cartório e com testemunhas, e o testamento particular, que pode ser escrito pelo próprio testador, mas deve seguir requisitos específicos para ser válido. Há ainda o testamento cerrado, que é lacrado e levado ao cartório para registro, garantindo maior sigilo.
Como tudo na vida, devemos antes de botar a “mão na massa” e formalizar o testamento, é essencial planejar. Então, primeiro faça um levantamento detalhado do seu patrimônio.
Liste seus bens – imóveis, veículos, investimentos, objetos de valor sentimental – e reflita sobre como deseja dividi-los. Lembre-se de que 50% do seu patrimônio obrigatoriamente pertence aos herdeiros necessários (filhos, cônjuge e pais, caso vivos). A outra metade pode ser distribuída livremente, seja para outros familiares, amigos ou até instituições de caridade.
Para garantir que seu testamento seja juridicamente seguro e não corra o risco de ser anulado, o ideal é contar com o auxílio de um advogado especializado em direito sucessório. Ele pode esclarecer dúvidas sobre cláusulas importantes, como inalienabilidade (impede a venda do bem pelo herdeiro), impenhorabilidade (protege contra dívidas) e incomunicabilidade (impede que o bem seja compartilhado com cônjuges). Esses detalhes podem evitar futuros conflitos e proteger os beneficiários.
O testamento deve ser registrado em cartório para ter maior segurança jurídica. Os custos variam conforme o tipo e o estado onde é feito, mas um testamento público, por exemplo, pode custar entre R$ 300 e R$ 2.000, dependendo da complexidade.
É importante destacar que um testamento não é definitivo. Você pode alterá-lo ou revogá-lo a qualquer momento, desde que esteja em plena capacidade mental. Caso suas circunstâncias mudem – como um novo casamento, nascimento de filhos ou aquisição de novos bens –, é recomendável revisar o documento para garantir que ele continue refletindo sua vontade.
Atualmente, o Brasil não permite testamentos 100% digitais. No entanto, há possibilidades de registros eletrônicos e assinaturas digitais em testamentos públicos, desde que cumpram as exigências legais.
Elaborar um testamento é uma forma de evitar disputas, reduzir burocracias e garantir que seus bens sejam destinados a quem realmente deseja. Com um planejamento adequado, esse processo se torna mais simples e eficaz.
Mitos e verdades sobre testamentos
“Testamento é coisa de rico.” Mito! Qualquer pessoa que tenha bens pode (e deve) fazer um testamento para evitar complicações futuras.
“Se eu morrer sem testamento, meus bens vão automaticamente para minha família.” Parcialmente verdadeiro. A divisão segue as regras do Código Civil, mas pode gerar conflitos e atrasos.
“Posso deixar todo meu patrimônio para quem eu quiser.” Mito! No Brasil, metade do seu patrimônio obrigatoriamente deve ir para herdeiros necessários (filhos, cônjuge e pais).
Testamentos inusitados e engraçados
Você já deve ter visto algum caso bizarro de testamento na internet. Desde um cachorro que recebeu milhões de dólares até doações para clubes de futebol são casos que chamam a atenção de todos. Listei alguns casos curiosos de testamentos ao redor do mundo:
- O empresário americano Leona Helmsley deixou US$ 12 milhões para seu cachorro chamado “Trouble”. Sim! O cachorro recebeu uma herança maior do que a maioria das pessoas verá na vida.
- Napoleão Bonaparte, em seu testamento, pediu que sua cabeça fosse raspada e os cabelos distribuídos para seus amigos. Um souvenir meio estranho, mas quem somos nós para julgar?
- Um senhor britânico chamado Henry Budd deixou uma fortuna para seus filhos, mas com uma condição: eles jamais poderiam deixar crescer um bigode. Parece que ele tinha um trauma capilar.
Além dos casos curiosos ao redor do mundo, o Brasil também tem exemplos de documentos de herança que geraram grande repercussão e disputas judiciais.
Um dos mais conhecidos é o caso do apresentador Gugu Liberato. Após sua morte, o documento que deixou indicava que a maior parte de sua herança fosse destinada aos filhos e sobrinhos, deixando de fora sua companheira de longa data, Rose Miriam. Isso gerou uma batalha judicial sobre o reconhecimento da união estável e o direito à herança.
Outro caso famoso envolveu o empresário Chiquinho Scarpa, que já declarou publicamente sua intenção de ser enterrado com seus bens de luxo, incluindo um carro de alto valor. Embora não tenha sido um documento oficial, suas declarações sempre geram polêmica e curiosidade sobre como grandes fortunas são distribuídas.
Esses exemplos mostram como um testamento pode evitar ou, em alguns casos, gerar conflitos inesperados.
Por que você deveria fazer um testamento agora?
Muitas pessoas deixam para depois a organização do próprio patrimônio, mas a verdade é que ninguém sabe o dia de amanhã. Um testamento bem elaborado não apenas garante que seus bens sejam distribuídos conforme sua vontade, mas também evita dores de cabeça para quem fica.
Entre as principais vantagens, podemos destacar:
Te dá paz de espírito – Saber que tudo está organizado permite que você viva com mais tranquilidade, sem preocupações sobre o futuro da sua família.
Evita disputas entre familiares – Com um documento claro e juridicamente válido, você reduz o risco de conflitos e longas batalhas judiciais.
Protege cônjuges e filhos – O testamento permite que você estabeleça exatamente quem receberá o quê, garantindo que nenhum herdeiro fique desamparado.
Nomeação de um tutor para filhos menores – Caso tenha filhos pequenos, você pode indicar uma pessoa de confiança para cuidar deles, evitando que essa decisão fique nas mãos da Justiça.
Destinação de bens para animais de estimação – No Brasil, não é possível deixar herança diretamente para um pet, mas você pode designar um responsável e garantir recursos financeiros para seu cuidado.
Evita que seu patrimônio se perca na burocracia – Sem essa formalidade, a divisão dos bens segue regras automáticas da lei, o que pode deixar pessoas importantes para você de fora da partilha.
Conclusão: um pequeno passo hoje evita grandes dores de cabeça no futuro
Fazer um testamento não é só coisa de milionário. Qualquer pessoa que tenha bens ou queira garantir o bem-estar da família deve considerar isso como parte do planejamento da vida. Se você nunca pensou sobre isso, talvez seja hora de reconsiderar. Afinal, um documento de herança bem feito pode ser a diferença entre um futuro tranquilo para seus herdeiros e anos de burocracia e conflitos.
Quer entender melhor como funciona o planejamento sucessório e quais os próximos passos? Confira nosso post completo aqui.
Perguntas Frequentes Sobre Testamento

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O que é um testamento e para que serve?
É um documento legal onde uma pessoa especifica como seus bens serão distribuídos após sua morte. Ele serve para garantir que a vontade do testador seja respeitada, evitando disputas entre herdeiros e assegurando uma distribuição patrimonial conforme seus desejos.
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Quem pode fazer um testamento no Brasil?
No Brasil, qualquer pessoa com mais de 16 anos e em pleno gozo de suas faculdades mentais pode elaborar um testamento. É essencial que o testador esteja consciente e capaz de expressar sua vontade de forma clara no momento da elaboração do documento.
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Quais são os tipos de testamento reconhecidos pela legislação brasileira?
A legislação brasileira reconhece três tipos principais de testamento:
Testamento Público: Elaborado em cartório, na presença de um tabelião e duas testemunhas. É considerado o mais seguro e transparente.
Testamento Cerrado: Escrito pelo testador e entregue lacrado ao tabelião, na presença de duas testemunhas. Seu conteúdo permanece em sigilo até o falecimento.
Testamento Particular: Redigido e assinado pelo próprio testador, com a presença de três testemunhas. Embora mais simples, pode ser mais suscetível a questionamentos quanto à sua validade. -
É possível alterar ou revogar um testamento após sua elaboração?
Sim, o testador pode modificar ou revogar um testamento a qualquer momento, desde que esteja em plena capacidade mental. Alterações podem ser feitas por meio de um novo testamento ou de um codicilo, documento destinado a pequenas modificações.
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O que acontece se uma pessoa falecer sem deixar testamento?
Na ausência de um testamento, a distribuição dos bens segue a ordem de sucessão estabelecida pelo Código Civil brasileiro. Os herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge) têm prioridade na herança. Se não houver herdeiros necessários, outros parentes podem ser contemplados, e, na falta destes, os bens podem ser destinados ao Estado.
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Quais são as limitações legais na disposição dos bens em um testamento?
Se o testador possuir herdeiros necessários, metade de seu patrimônio (chamada de “legítima”) deve ser destinada a eles. A outra metade (“parte disponível”) pode ser livremente distribuída conforme a vontade do testador, podendo incluir amigos, instituições de caridade ou outras pessoas não contempladas pela sucessão legítima.
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Quais documentos são necessários para elaborar um testamento em cartório?
Para elaborar um testamento público em cartório, o testador deve apresentar um documento de identificação válido (como RG ou carteira de motorista) e fornecer os dados das testemunhas. É recomendável consultar previamente o cartório escolhido para obter informações detalhadas sobre os documentos exigidos.
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O que é um testamento vital e qual sua finalidade?
O testamento vital, também conhecido como diretivas antecipadas de vontade, é um documento onde a pessoa expressa seus desejos referentes a tratamentos médicos e intervenções de saúde caso venha a ficar incapacitada de comunicar suas decisões no futuro. Diferentemente do testamento patrimonial, o testamento vital trata de questões relacionadas à saúde e bem-estar durante a vida do indivíduo.

Bacharel em Direito pela PUC-PR
Bacharel em Administração de Empresas pela UEL-PR
Oficial de Justiça Avaliador Federal TRT-PR